sábado, 26 de julho de 2008

Individualidade e inveja... morrer?, para quê??

Como seria um olhar sem inveja, como veria os outros, desde os que consideramos "santos" aos "egoístas", etc?

No filme Life After Life, Raymond Moody entrevista uma série de pessoas que afirmam ter tido experiências após a morte. Nessas entrevistas todas as pessoas descrevem um encontro com um ser que as compreende sem as julgar. Quando encontram esse ser ele pergunta-lhes o que aprenderam nessa vida e toda a vida passa diante delas como se o tempo adquirisse mais dimensões e pudesse ser visto todo ao mesmo tempo e andar para a frente ou para trás (como fazemos com uma paisagem).

Os relatos destas pessoas são tudo menos bem estabelecidos científicamente. Se pudemos duvidar da veracidade da teoria M (teoria das cordas), do porquê de por vezes o alcatrão da estrada reflectir o céu, dos modelos de funcionamento do cérebro, dos modelos de previsão do clima, das fases da vida das estrelas, do modo como as galáxias apareceram, do funcionamento das patas dos lagartos, da personalidade real do filósofo Sócrates, do porquê dos sonhos, da necessidade de dormir, ou, até, de sabermos com certeza se o futuro será como o passado e se o sol irá nascer amanhã, pois certamente este tipo de relatos, impossíveis de testar de forma objectiva e sistemática, será ainda mais falível, mais objecto de incertezas. Poderá ser uma simples fraude, uma experiência provocada pela falta de oxigenação do cérebro, ou simplesmente uma bela história com uma finalidade teológica qualquer ao serviço de um qualquer grupo ou religião.

Seja como for eu acredito nela, não é uma crença justificada por outras crenças, mas apenas pela própria experiência em si. Ou seja, tal como acredito na beleza do mar, apenas porque a sinto, não sabendo porém se aquilo que sinto tem algum valor ou realidade para lá da própria sensação, também em relação a esta presença, que não julga, que tudo compreende, que é luz pura, também acredito porque a sinto, apesar de não saber se a essa sensação corresponde algo fora de mim.

Seja como for não precisamos de acreditar na realidade de um tal ser, basta-nos a sua concepção ideal para compreender que uma visão sem inveja seria uma visão incapaz de julgar, ou melhor, uma visão onde a compreensão do outro, da sua viagem, dos seus motivos, é tão profunda, que todo o julgamento desaparece, sendo convertido em visão.

Por outro lado, a falta de compreensão gera um hiato entre a minha visão e a visão do outro. Então posso considerá-lo um deus ou um diabo, ou outra coisa qualquer. Ou seja, para complementar essa falta de visão, de compreensão, terei de estabelecer outra ponte qualquer. Essa ponte é o juízo, dizer: "fez bem" ou "fez mal" colmata séculos de investigação que seriam necessários para saber porque é que a Joaquina matou o José.

Mas quando compreendemos verdadeiramente porque alguém fez isto ou aquilo, estamos mais próximos (se bem que ainda muito distantes) do psicólogo do que do juíz. Para o psicólogo não fará grande sentido condenar alguém. Qualquer criança chora por uma razão, qualquer pessoa faz o que faz por uma razão. Algo teve de acontecer, a nível físico, psicológico, cultural, etc, que justifica a acção daquela pessoa. Quanto mais não seja, a sua própria liberdade.

Deus (a tal luz dos relatos) seria nesta perspectiva também o psicólogo perfeito. Teria não apenas uma compreensão do outro, mas uma compreensão total, de cada momento, de cada parte, da articulação, da decisão, do peso que a liberdade teve em tudo isso, etc. Mas um psicólogo perfeito vê com total clarividência, tudo o que faz em seguida é no sentido do futuro. Para ele não faz qualquer sentido condenar a não ser como estratégia para o futuro...

É claro que o homem, enquanto homem, não poderá nunca ter uma perspectiva completa sobre uma pedra (que inclui a sua estrutura molecular e quântica, etc, a sua história, a sua relação com cada outra parte do Universo que a influencia e influenciou, etc, já sem falar das possibilidades futuras), uma árvore, uma nuvem, um rio. Portanto não terá também qualquer possibilidade de vir a compreender na totalidade outro ser humano (ou restantes animais). Se bem que a psicologia de um ser humano (ou de outro animal) seja infinitamente mais simples comparada com a estrutura molecular de uma pedra, mesmo assim é demasiadamente complexa para ser apreendida inteiramente. Seja como for, é pouco crível para mim que compreender alguém se reduza a compreender a sua psicologia.

Dado este estado de desconhecimento inultrapassável como pode o homem estar perante os seus pares e o mundo. Bem, a ignorância em si mesmo pode dar origem a muitos sentimentos: medo, mistério ou inveja, por exemplo. O medo leva ao afastamento, o mistério à contemplação, a inveja leva à condenação.

Quando olhamos para o mundo com olhos de ver vemos algo muito para além do Paraíso. Cigarras e formigas, joaninhas e escaravelhos, ratos e serpentes, leões e corças, aranhas e mosquitos, pardais e andorinhas, todos gozam o momento... O prazer de todos, em uníssono, é um som difícil de suportar, uma felicidade atroz que nos parte os limites de ser, que nos rebenta numa gargalhada, que nos parte os princípios e os fins, que nos acorda para um outro mundo: o mundo REAL.

Toda essa beleza, toda essa alegria, é incompatível com a nossa vida miserável, com as nossas preocupações com o dinheiro, com o trabalho, com o que os outros ganham ou pensam de nós, ou porque têm uma vida mais fácil, com o sofrimento dos animais e do mundo. Por isso temos de fazer uma escolha: ou escolhemos a alegria ou escolhemos o eu. O eu exige paredes, medos, divisórias; para haver um eu tem de haver um tu, um medo, uma possibilidade de queda, um afastamento. A Alegria do mundo, do planeta, de cada bicho unida à de todos os outros é demasiado Feliz, demasiado Orgástica, para nos deixar manter nos nossos frágeis limites do Eu. Ou a ouvimos e nos partimos, ou nos mantemos unos na nossa concha, na nossa solidão, e então temos de reinventar tudo, de redefinir tudo. É aí que aparece uma visão alternativa da vida e das coisas, onde o sofrimento é fundamental. Agarramo-nos, não ao biliões de biliões de animais que vivem em joyeusement, alegria profunda e dedicada, mas àqueles momentos de sofrimento por vezes associados ao fim da vida ou à impossibilidade de chegar ao objecto do desejo. Então pega-se num animal que está quase a morrer ou vive preso e arrasta-se o seu sofrimento, prolonga-se o seu sofrimento, enfatiza-se, publicita-se... Contempla-se... e, nessa contemplação, descobrimo-nos como santos por o fazer permanecer vivo assim por vencermos assim a "infelicidade" do mundo.

Nessa visão do mundo nós somos os grandes heróis num mundo marcado pela dor, pela perda, pela derrota. Somos os maiores, tentando "salvar o mundo". Na verdade, porém, nós estamos é a tentar salvar o nosso eu do abraço murmurante de prazer do mundo, para que ele não acabe connosco num orgasmo sem princípio nem fim. Porque, mesmo enquanto morre, o animal está vivo. E estará vivo, presente, no momento, e quando deixar de estar presente ficará apenas o seu corpo. Mas tudo o que observamos é vida, e depois cadáveres vazios dela. Em nenhum momento a vida cede à morte. Em nenhum momento se "morre" verdadeiramente, como algumas pessoas parecem crer, a não ser que com isso digam que a vida deixou de se manifestar. Tudo o que se possa dizer para lá disso (ou seja, que a alma permanece ou não permanece) é pura especulação.

Alimentando assim um mundo onde a morte é uma coisa má, onde o sofrimento é preponderante, conseguimos manter uma certa individualidade. Mas o nosso pior inimigo é o prazer dos outros. Quando vemos as andorinhas a voar, naquele êxtase de se dissolver no vento, pensamos "ah! mas não pensam, e logo virá a morte e os caçadores". Quando vemos um belo animal pensamos "ah! mas já estão em extinção" ou "os homens vão matá-los" ou "não são tão bons como nós" ou "mas há muitos que não apreciam esta beleza" ou "poderia dar uma bela pele".

Ou seja, substituímos a visão extasiante da beleza por outros pensamentos mais negros que nos permitam manter a ficção de que este é um mundo menos que "Beyond Paradise", que é feio, que é dor, que é injusto, que é cheio de perigos, etc.

Assim mantemos a nossa identidade...

Pior do que isso é quando a visão da beleza é tão forte que não nos dá lugar para fugir dela. É o caso do sexo entre dois amantes: vamos escondê-lo, proibí-lo, condená-lo! É o caso da vida das andorinhas e dos pardais e dos golfinhos e de tantos outros... vamos denegri-los, vamos usá-los, vamos matá-los! É o caso do próprio Universo que na sua visível infinitude, perfeição e complexidade nos faz esquecer de nós: vamos ignorá-lo - as estrelas não têm nada a ver com o preço do gasóleo, é com isso que nos devemos preocupar.

Com todas estas estratégias o homem conseguiu sobreviver como indivíduo. reCriou-se a si próprio. Ganhou um lugar privilegiado no universo como "Filho de Deus", veículo para o Nirvana, dono do mundo, empresário, investigador, etc. Nesse papel irá evoluir certamente muito, pelos milénios fora e dará origem a outras formas de vida, como organismos cibernéticos, cujo tempo de vida e capacidades cognitivas lhes abrirão mais as fronteiras da percepção e cognição, permitindo-lhes talvez escapar mais um pouco a esta cegueira. Daqui a milhões de anos, quem sabe a que daremos lugar?

Mas sem dúvida que o nosso individualismo cumpre um papel, uma função, certamente que não seríamos os mesmos caso a beleza extasiante e tão plena do mundo nos fosse visível. Certamente, não seríamos humanos, mas outra coisa qualquer...

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Quem critica o egocentrismo, fá-lo por inveja?


Costumamos dizer que o egoísmo traz infelicidade, mas de facto traz-nos mais infelicidade a nós, sobretudo quando vemos o pessoal com quem não nos identificamos, que não joga o nosso jogo, a divertir-se. Para o pessoal intelectual o futebol é uma perda de tempo, e o Ronaldo, o Figo, o Mourinho e outros que tais, são apenas palhaços num circo nacional destinado a entreter as pessoas e a distraí-las do que é importante (política, espiritualidade, problemas sociais, amor, etc).
Esquecem-se que se sentem mais felizes quanto mais infelizes esses tais se mostram. A infelicidade da derrota do egoísta é a coisa que nos dá mais prazer. Nessa altura entramos como santos: «estás a ver? Isso do futebol não te traz nada de bom, é so frustrações em cima de frustrações e mesmo quando ganhas, é sempre um risco, podes perder no ano a seguir.»
Somos os salvadores, os benfeitores. Mal mesmo é quando eles se dão bem e cada vez entram mais no vício. Da mesma forma com o tabaco. Como detestamos os vícios dos outros, sobretudo quando lhes dão muito prazer!! Eles a divertirem-se com aquilo! Ahhh! Que nojo. O melhor mesmo é quando têm tosse e cancro etc. Nessa altura é como se o céu nos ouvisse e finalmente nos desse razão: «Estás a ver, há quanto tempo te dizia que isso era mau para ti?»

Mais uma vez somos os anjos salvadores, como aqueles inquisidores de outras eras, também eles fantasiados de Santos que nos vinham salvar do sexo e das orgias e dos pensamentos inconsequentes e alheios à vontade do Senhor.
Que bons que eles eram, e que maus que nós, pecadores, éramos. Hoje em dia nada mudou. Já não se critica os judeus, não vão para a fogueira, e os fornicadores até passam despercebidos. Mas o discurso crítico continua o mesmo de uma facção da sociedade para as outras. Os intelectuais criticam o futebol, os pais criticam as drogas, todos criticam os políticos (incluindo eles próprios) e, em tudo isso, o que mais nos apavora são os incríveis prazeres que o egocentrismo proporciona.
Não aguentamos que alguém se divirta mais do que nós. Só se for da nossa equipa, só se nos identificarmos com aquela camisola. E, aí sim, ai que bom é o engenheiro Sócrates, ai que bom era ser como o Huxley e tomar LSD à vontade, ai que bom ser como a Madona e poder consumir crack, ai que bom ser rico e poder andar com jaguares, ai que bom é o Figo e o Ronaldo que nos levaram à Taça! Ai que bom - quando participo, quando sou uno com os que ganham...


Mas não me deixem ver o prazer dos outros, escondam-no entre os lençóis, tapem-no entre esquinas escuras e vielas escondidas, proibem-no, queimem-no, não falem dele, façam-no tabu...

Que eu não quero saber de como os fanáticos da religião se sentem plenos de amor, como os fotógrafos da natureza ganham a vida a viajar, como os que nascem ricos nunca tiveram de trabalhar, de como os ursos vivem de papo para o ar, e os pandas passam a vida a dormir e os golfinhos a festejar: tapem-me as cobertas do mundo. Deixem-me dormir de mansinho, calminho, no meu quartinho de janela pequena e virado apenas para o que eu gosto,

não aguento, não, não aguento, os rugidos de prazer dos outros,

especialmente os que não jogam os meus jogos,

vamos condenar o egoísmo:

têm de ser todos bons,
como eu!!

^_^

quarta-feira, 23 de julho de 2008

Para além do bem e do mal -- Infinita Imensidão -- Beyond Paradise

Que outra forma há de viver que não seja procurando o que desejamos e criando distância do que tememos? Um mundo visto assim, por uns olhos de um tal ser vivo, é uma Viagem e está dividido ao meio: a parte boa, de que nos queremos aproximar, e a parte má, de que queremos fugir a todo o custo, mais essa zona difusa de permeio, às vezes gigantesca, do que não metemos claramente nem num saco nem no outro...

Quando olhamos para o Cosmos, no entanto, temos dificuldade em manter essa perspectiva. É como se, o Infinito em que se espalham biliões de Galáxias e mundos sem fim, diluísse os nossos "problemas", as nossas ambições, a nada... Nessa infinita imensidão, onde tantos incontáveis biliões de biliões de seres procuram a seu tempo as suas "preciosidades", somos apenas mais um. Um pequeno habitante de uma imensa floresta, onde tudo, mas absolutamente tudo, tem o seu papel.

É como se, de repente, a mosca verificasse que o a aranha tinha o seu papel. Que se não fossem as aranhas e outros predadores e doenças, os insectos cresceriam exponencialmente até arrasarem com todos os recursos. Tudo se alimenta de tudo, e é precisamente o facto de os excessos de uns alimentarem os excessos de outros, contrabalançando-os, que faz com que a floresta se mantenha, ao longo dos milénios, de forma harmoniosa. Cada predador desempenha o seu papel.

Por outras palavras, é como se o homem compreendesse subitamente que as doenças, a falta de comida, as pestes, as guerras, os ditadores, etc, fazem parte do equilíbrio do mundo. São a forma de manterem em equilíbrio a ambição desmesurada do próprio homem, que procura sempre mais e mais, até se converter numa das piores pragas que o planeta já conheceu.

De rei do mundo e Filho de Deus, a praga infestante, a distância é pequena ou quase nula, melhor dizendo, uma é causa da outra. É precisamente por pensarmos que temos direito a tudo, que podemos explorar sem limites todos os recursos do planeta, que podemos tratar os animais como objectos e as coisas como instrumentos do nosso bem estar, por pensar que somos sagrados num mundo profano, é essa Ilusão de Grandeza, essa Cegueira, que faz de nós pragas. Cegueira certamente partilhada com as moscas que também não estariam dispostas a conterem-se em nome do bem estar de tudo.

É irónico que, em nome do bem, de Deus, do Sagrado, se combatam as doenças e a fome, os predadores e a morte, quando, vistos a outra escala, essas mesmas coisas são tão Sagradas como tudo o resto, são tão boas como tudo o resto, trazem equilíbrio, são o produto do nosso próprio desequilíbrio, do nosso desrespeito para com tudo o resto.

Dito de outra maneira, se os insectos se tivessem dado conta de que tudo à sua volta merecia viver tanto como eles, que tudo era Belo, infinitamente belo, teriam certamente evitado a destruição da floresta, porque se compreenderiam como parte dela e não acima dela. Por esse motivo, ter-se-iam contido no que comiam, nos números em que se reproduziam, etc. Sem excesso de insectos nunca teriam surgido pragas de aracnídeos capazes de os comer. O excesso de uns provocou o aparecimento dos outros.

Do ponto de vista Cósmico, tudo faz sentido. Não há uma única coisa que tenha aparecido sem razão para isso, sem uma história que a sustente. Tudo se integra coerentemente numa história comum onde cada coisa acontece devido a tudo o resto ter também acontecido e cada coisa é também uma (ínfima) razão para tudo o resto acontecer. Nesta concepção do Cosmos, cada parte é o resultado e um contributo para o todo.

Um homem iluminado pela luz do Cosmos é como uma mosca que subitamente compreende, grosso modo, que as coisas que lhe fazem medo, também têm uma Beleza intrínseca, um papel, um valor. Ela não deixa de ter medo, não deixa de ter dor (se é que as moscas sofrem ou pensam), não deixa de fugir dos seus inimigos, de procurar comida e de combater quem lhe faz frente, não deixa de ter dias bons e dias maus...

E no entanto, no meio de todas essas viagens, há algo que a distingue das outras moscas. Ela olha para a aranha e, em todos aqueles oito olhos, naquelas patas longínquas, naquela sede de apanhar e comer, a mosca vê uma beleza, uma irmandade, uma frame comum, entre ela e a aranha e a árvore e a estrela, a e planta devoradora de insectos e a papoila e o girassol.

Nisso que têm de comum, a mosca encontra a imagem mais bela de si, que é também a imagem de tudo, a imagem de um Cosmos perfeito, infinitamente complexo, imagem - porta de Entrada, para a Beleza Infinita que lhe subjaz...

Se o Homem se tivesse visto como parte de um Universo todo ele sagrado, do maior grupo de galáxias à mais pequena partícula, teria procurado compreendê-lo em vez de o instrumentalizar, teria vivido a Beleza em vez de lutar contra monstros, exteriormente viveria mais ou menos da mesma maneira, em Viagem, mas interiormente teria chegado ao Paraíso em vez do Inferno que criou, com os seus medos, para si próprio.

Num Universo onde tudo é sagrado, não pode haver bem e mal, estamos para lá do Infinito, num local bem para lá do Paraíso - vou chamar-lhe Beyond Paradise

segunda-feira, 21 de julho de 2008

a oração do Eu



Eu quero ser bom
eu quero ser puro
eu quero o melhor para ti
eu quero anular-me
eu quero ser melhor
eu quero agradar-te
eu quero fazer bem
eu quero ajudar
eu quero obedecer
eu quero desaparecer em ti
eu quero ser melhor
eu quero superar-me
eu tenho tantas faltas
eu sou tão infeliz
eu pequei tanto
eu irei pagar
eu vou sofrer
eu vou transcender
eu vou para lá da dor e do prazer
eu quero ser teu
eu quero ser belo
eu quero ser forte
eu quero vencer
eu quero ser aceite
eu quero desaparecer
eu quero morrer por ti
eu quero merecer-te
eu quero viver enfim
..........um único dia de paz...

eu quero
eu quero
eu
eu
eu...

eu

e se não houvesse eu?

?
nada teria a perder
senão a Gargalhada
ENORME
do Mundo
abrindo-se de Flor em Flor!!



sexta-feira, 18 de julho de 2008

Conto quase erótico

Tu eras tão presa, tinhas tantos medos,

mas lentamente fui-te ajudando a perceber que não fazia mal, juntos penetrámos nos teus segredos, os teus piores medos.

ensinaram-te que eras feia, a teres vergonha: disseram-te isto em ti é proibido, não o podes mostrar.

Pois a mim podes-me mostrar. Não te direi "desavergonhada" ou "porca". Pelo contrário, admirarei aquilo que outros desprezaram ou meramente cobiçaram como coisa a usar e deitar fora.

Direi que és Linda, e, lentamente, recuperarás a confiança perdida na tua própria beleza, no teu próprio corpo. Porque com dois é mais fácil de enfrentar os demónios.

Confia em mim também os teus segredos, os teus secretos impulsos, que, igualmente, paralelamente, te levaram a desprezar e a esconder. Da mesma forma não te direi que és "porca" ou impura por desejares o que se convencionou ser proibido. Direi que é natural, porque me amas, e que amar o sexo do amado e desejá-lo é tão só a expressão de um grande amor.

Não te baterei nem te condenarei, antes aceitarei os teus anseios e desejos e dir-te-ei que os tenho também. Como dois confidentes começaremos a aceitar intimamente tudo aquilo que nos foi negado pela sociedade ter de forma natural. Seremos dois viajantes, caminhantes, à procura de uma infância primordial esquecida onde tudo é afinal belo, onde não existe pecado senão a própria rejeição da verdade que somos e vivemos.

Aceitando tudo em ti, reconhecer-te-ei, bela, esplêndida, magnífica. E, se fizeres o mesmo comigo, oh!, que valor darás então às minhas palavras, tal como eu às tuas. Encimar-nos-emos aos dois em cima da mais alta montanha onde seremos expoentes máximos de beleza, nessa cama alquímica onde nos despimos de roupas e reganhamos a nossa honra da forma menos púdica possível.

Depois deixar-me-ás despir-te cada vez mais, para lá das roupas, vou mexer-te nas tensões do corpo. Deixa-me abraçá-las, agarrá-las, tocá-las, para que se dissipem, para que se tornem férteis, não de dor e embaraço, mas de ternura e de prazer e abertura a tudo, à criatividade.

Serei como um saca-rolhas, sacando um a um esses medos que te afogam e te prendem, vou ensinar-te a ver o corpo de outra maneira...

Serás um instrumento de prazer, por instantes, veremos tudo o que a sociedade nos disse de pernas para o ar.

E agora quem és? Cada vez mais livre, menos medos te afogam, sabes tudo sobre ti, nada te enoja. Estás solta, aberta ao tempo, aberta ao mar e à vida. Livre para abraçar tudo e para com tudo lidar.

Eis o que fizeste de mim: um herói, um navegante feliz, um Êxtasiado contigo e com o tudo de que fazes parte.

Seremos dois ou um só? Perderam-se as fronteiras, perderam-se os braços e as pernas. Fica apenas o beijo, o gesto, a carícia,

aquele... em que dois se transformam num

a olhar o Cosmos,

Abertos e pontiagudos simultaneamente,
entrando em tudo, abertos a tudo,
abençoando tudo,
em Deus.

A liberdade não tem forma

(este texto é mau, mas a liberdade que está por trás de tudo não tem fim)

Todos nós sentimos que temos dentro de nós algo extremamente belo... algo que podemos querer dar, preservar, ostentar, usar como arma, etc.

Por vezes olhamos o mundo como se fosse um espelho de Deus. Mais vulgarmente ainda, olhamos o nosso corpo, a nossa vida, como se fosse um espelho de nós. Se temos sucesso somos bons, o nosso fulgor interior, essa beleza intangível, mostrou as suas fagulhas na prática. Fomos reconhecidos pelo que realmente somos! Esse reconhecimento atrai, como um magnete. Talvez porque vemos nessa imagem, nesse reconhecimento, nesse gesto que tem o seu quê de perfeito, uma verdade importante e profunda, como se algo vindo do além, e que sabemos ser verdade (a nossa própria beleza interior) se concretizasse agora nesta realidade - a Beleza mostrou-se finalmente: afinal somos realmente bons escritores, fotógrafos, bons pais de família, bons amantes, bons negociantes, ricos, famosos, inteligentes, espertos, divinos... Que verdade saborosa e eu sou assim, de facto!!

E então olhamos para essa figura no espelho e queremos para sempre ser assim, como ela. Porque achamos que ela nos expressa, a nossa realidade bela e interior. Agarramo-nos a ela, identificamo-nos com ela. A partir daí queremos crer que somos aquilo e esforçamo-nos para os nossos filhos gostarem sempre de nós daquela maneira (eu sou um bom pai), para escrevermos textos belos e profundos (eu sou um bom escritor), para continuarmos a ter sucesso nos negócios daquela maneira (eu sou inteligente). Fomos reconhecidos por isto, agora vemo-nos como isso. Confundimo-nos com a nossa imagem no espelho...

Esquecemo-nos, no entanto, que um espelho é só um espelho. Um espelho não tem órgãos, nem coração. Numa sociedade ou mente corrupta o santo que existe em nós é violado, vilipendiado ou desprezado, numa sociedade ou mente adormecida é simplesmente ignorado ou esquecido. Os espelhos estão muitas vezes sujos, são pequenos, deformam. Mas, mesmo quando são perfeitos, revelam apenas uma pequena parcela de nós.

A nossa beleza interior, que, acho, todos sem excepção sentimos lá no fundo, como ponto primordial de toda a nossa inspiração, como alimento da nossa vida, não pode ser retractada nem condensada por nenhum dos nossos gestos. Toda a nossa vida, quer tenhamos sucesso ou insucesso, diz, na melhor das hipóteses, apenas parte do que somos, e, na pior, é como um autocolante que nos esconde o interior. Esse belo interior, esse Paraíso escondido, no máximo, poderá ser adivinhado, por quem nos ama. Mas esses não precisam de sinais exteriores de riqueza interior. Adivinham-na, nem tanto pelo olhar, é qualquer coisa que está para lá do gesto e que também existe nas conchas e em todos os mares... Por isso se chamam amantes aos amantes, para lá do concreto vêem o Paraíso escondido, semi-revelado, nas dobras perfeitas dos seus amados.

... esquecemo-nos tantas vezes que um gesto é apenas o reflexo de um casamento entre tudo o resto e algo infinitamente Belo e muito íntimo e indizível:

a origem da Liberdade...