terça-feira, 4 de março de 2008

No meu mundo ideal

Ninguém trabalhava!!

Já vivemos num mundo esplendoroso e infinito, que mais queremos?

Aproveitá-lo melhor, ora!

Somos articulados de biliões de células cozinhado lentamente por milhares de milhões de anos, neste planeta e antes dele, no vasto caldeirão estelar onde cada célula do meu corpo surgiu.

Planeta rodopiante, viajando no espaço estelar infinito, deste-nos com jeitinho à luz, às trevas, ao mar, à terra... mas, como animais que somos, mesmo racionais, vivemos alienados de ti e de tudo o que nos deu origem e da semente que somos.

No meu mundo ideal ninguém teria de trabalhar, pois só assim pode o homem despertar para as estrelas, sua origem, destino e único caminho.

Fala-se de favelas, fala-se de pobreza, de violência conjugal, ainda há fome nos nossos abastados países, ainda há guerra no mundo, ainda há falta de cereais nos países pobres, mesmo quando nascidos em continentes da abundância, desgastados por tantos ódios e ignorância.

As nossas preocupações são como a jaula do pássaro, só vemos a alpista, o ninho, a água, o parceiro. A nossa vida resume-se à nossa preocupação. A violência atira as estações pela janela, a luta sindical não deixa ver os lírios e os campos em flor... Tudo é preciso, tudo é necessário, para sermos lúcidos.

O homem quis ser racional, mas falta-lhe ser desperto. De que serve a racionalidade de uma máquina de calcular, de um tanque de guerra, de uma sala de tribunal, de uma mente a pedinchar.... de que serve se para tudo estamos adormecidos?

Por isso, no meu mundo ideal, ninguém teria de trabalhar, nem de se preocupar. Os nossos sanatórios seriam as flores, os psiquiatras as árvores, não haveria guerras nem violência conjugal porque o nosso olhar estaria espantado com o espaço entre as estrelas e todos faríamos cantigas e poemas para que escorresse delas o encanto...

Então e as doenças e a comida e os esgotos e os transportes públicos e os médicos e os varredores do lixo e os mecânicos e os farmacêuticos e os comerciantes e os talhantes e os turistas e...

Ficaríamos na selva à espera que anonas caíssem?

Não! Vejamos!

Hoje em dia apenas 1 por cento da população precisa de trabalhar na agricultura para que todos sobrevivam. As máquinas são construídas com a ajuda de máquinas. A grande produção que ocorre nos nossos dias é para fazer o supérfluo. São carros novos todos os anos, são mais e mais telemóveis e televisores e máquinas de lavar e aparelhagens e computadores. Lixo e mais lixo... Andamos escravizados 30 e tal horas por semana para produzir lixo e o conseguir vender! É por isso que os nossos filhos crescem sem a presença dos pais e que todos vivem na solidão de olhar para a televisão. Para produzir quantidades tremendas de lixo e o tornar apetecível!

Para produzir apenas o que realmente precisamos bastaria produzir talvez um terço do que agora produzimos (talvez nem tanto!). Por outro lado, a maior parte das pessoas trabalha em empregos que resultam da tentativa de vender o supérfluo a quem não precisa. São os consultores de marketing, os publicitários, os gerentes, os administrativos, os administrativos dos administrativos e por aí fora. Um banco ou uma empresa de telecomunicações alberga milhares ou mesmo centenas de milhar de trabalhadores, quando na verdade umas poucas centenas bastariam (sem publicidade claro está, porque um bom serviço fala por si mesmo).

Ou seja, se eliminarmos a produção excessiva eliminamos a publicidade, a necessidade de marketing, muitos gestores e administrativos. O que faremos com tanto desemprego?

A resposta certa, para a maioria das profissões que todos podemos fazer (canalizador, varredor de ruas, condutor de transportes públicos, etc) é a rotatividade. Neste capítulo podemos trabalhar todos talvez uns meses por ano, e já chega. Deve ser giro conduzir um autocarro durante quinze dias por ano, depois um barco, depois um combóio! Deve se giro operar as alfaias agrículas por uns dias, ou quem sabe, ser piloto de aviões (isto só para quem quer, porque a preparação exigiria meses)... Noutros dias limpar as ruas, noutros trabalhar numa fábrica de produtos alimentares. Num único ano cada pessoa teria mais de 10 ou 15 trabalhos diferentes, todos diversificados, correspondendo ao seu perfil. Nesses meses em que trabalhasse cada pessoa daria a sua contribuição pública, no resto do tempo estaria simplesmente feliz a usufruir do Tempo!! Como quisesse (talvez apenas contemplando o sol, escrevendo textos, dançando, compondo música, divertindo-se com amigos, no desporto, etc).

Num mundo assim haveria menos necessidade de médicos e hospitais e medicamentos. Não haveria stress, a felicidade seria a nota mais comum, contemplação e criatividade, e os miúdos fariam desportos diversos em vez de se organizarem em claques. Deixaria de haver tanta necessidade de juízes e tribunais e polícias e hospitais.

Ainda menos necessidade de produtividade.

Ou seja, o meu mundo ideal é aquele onde se trabalha o mínimo para ser feliz, onde as pessoas não estão para se chatear com o supérfluo, mas se concentram no essêncial. O resto do tempo, guardam-no para ser Feliz, para partilharem com os amigos as alegrias de ser, a cada momento, uma parte da poeira cósmica, tão deslumbrante, que nos envolve e nos anima a todos...

(Se isso não acontece nem vai acontecer (por isso é meramente ideal) é porque vivemos - os Europeus - muito tempo embrulhados na nossa máscara de seres superiores, explorámos África, a Ásia, e olhamos com medo e desprezo para os nossos irmãos muçulmanos. Hoje temos medo, que a colonização se volta contra nós, que os pequenos, que agora se tornam grandes (China e outros), apesar dos nossos esforços, nos façam o que lhes fizemos a eles. E então tentamo-nos manter on top of the world, a produção, o obsessão com a produtividade é no fundo o medo das democracias em serem engolidas vivas pelas tiranias e outras ideologias totalitárias. Mas essa ameaça bem real é o preço a pagar por séculos de desprezo.)

Já vivemos no Paraíso, mas tratámo-lo e tratamo-lo como se fosse o Inferno onde os nossos medos nos encerram; vamos criar em nós a Abertura ao Paraíso, que já é desde sempre, e desde sempre nos deu origem; talvez ela se espalhe como semente e, ao longo dos éones, a nossa selva humana se abra mais ao Cosmos :)

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