quinta-feira, 5 de junho de 2008

Gostas mais do doce ou salgado?

gostas mais do doce ou salgado? Preferirias ser Rei ou Mendigo, Deus ou Amante sedento?

Friedrich Holderlin no seu livro, Hyperion, afirma que

"O HOMEM É UM DEUS QUANDO SONHA E UM MENDIGO QUANDO RACIOCINA."

É um pouco como quando conhecemos alguém tão profundamente que nesse mundo, da intimidade sem palavras, parece que não há distinção entre eu e o outro, mas apenas continuidade. Somos o mesmo em dois corpos, somos um. Mas quando pensamos, quando reflectimos sobre ele, vem novamente a distinção, fomos como que expulsos do Paraíso, agora há o tu e o eu, agora somos dois onde antes havia apenas um.

Havendo um não há necessidade de linguagem ou aprendizagem, esta cumplicidade, interioridade, não exige qualquer conhecimento, apenas uma alma que não seja pequena e fechada.

Mas será que nos contentamos com isso? Não será essa cumplicidade apenas um prelúdio, um convite, a uma fusão ainda maior?

Nesse livro / poema o Holderlin queixa-se:

"Oh meu Belarmin, nestas alturas permaneço frequentemente. Mas um momento de reflexão atira-me para baixo. Ai, o homem é um Deus quando sonha, mas um pedinte quando pensa."

Ora, não será precisamente isso que sentimos mesmo com aqueles que amamos profundamente? Num momento somos um, mas no outro já estamos afastados novamente. Afastados por quezílias, desejos mal entendidos ou mal pronunciados, enfim, é a incomprensão, a cegueira que nos afasta. Do mesmo modo, olhamos para as estrelas à noite e sentimo-nos num mundo infinito e perfeito, mas quantos de nós se lembram delas durante o dia, e se sabem e sentem, vogando nesta frágil esfera, rodando pelo meio do espaço cósmico?

Pode ser que o Amante, olhando a sua Amada, a compreenda profundamente. Mas isso não chega para a conhecer. É como se nos contentássemos tanto por receber o convite que nos esquecemos de ir à Festa!! Conhecer a Amada é também conhecer a sua história, as suas predisposições, os seus medos, as suas virtudes, as suas derrotas. É um trabalho infinito, e nessa aplicação de tempo e energia, vamos construindo pontes que vão tornando essa Unidade inicial em algo mais profundo, mais Verdadeiro, mais Pleno!

Por isso, ser mendigo é necessário, é complementar de ser "Deus" (neste sentido de se sentir Uno e Pleno). É no jogo, na dialéctica, entre ser Mendigo e ser Deus, entre Saber tudo e ignorar-se tudo, entre tudo ter e tudo procurar, entre usar o para-lá-do-espírito e a mente, que vamos viajando neste mistério Cósmico à procura de tudo, incluindo a de desvendar a nossa própria essência.

Resumindo: os mendigos, esses pensadores eternamente arredados dos objectos que reflectem cada vez melhor, vão à lua, desvendam a composição de estrelas e planetas, mergulham em buracos negros, contemplam galáxias, os mistérios do clima, as civilizações passadas, a história do planeta, viajam nos Oceanos e conhecem biliões de espécies, seres e histórias... o seu olhar abarca biliões de anos, a sua viagem é infinita e infinitamente bela: esse é o milagre do homo sapiens - usou a mente como asas que lhe permitiram contemplar muito mais do que a sua própria vida, não tem asas mas voa muito mais alto do que os outros seres vivos. Ao contrário de outros animais, não tem de ter a visão centrada em si próprio, o seu olhar pode abarcar muito mais. É claro que isso ainda é muito pouco e talvez daqui a biliões de anos nós pareçamos também limitados como os macacos nos parecem hoje a nós. Mas tanto nós como esses seres superiores, seremos eternos mendigos, porque teremos sede e fome desse Encontro com tudo, e estaremos a caminho...

Mas por outro lado, há ainda um outro lado de nós, de Deuses, que por sua vez, já têm tudo, são Plenos, não precisam de nada e todo o mundo está para eles aberto, no seu Mistério, de par em par. Estão em todo o lado, são tudo!!

Estes dois lados não se devem opor, eles são como o lado esquerdo e direito da mesma face. Estar a caminho e chegar, na verdade, são dois momentos da mesma dança, do mesmo Êxtase...

O desapego leva ao Encontro do que está para lá da forma, e vice-versa; quem vê a partir do limitado verá um pedinte, afastado de tudo, quem vê a partir do infinito verá Deus, celebrando tudo; reconhecer ambas as faces como caminhos uma para e na outra é parte do despertar.

1 comentário:

Unknown disse...

Gosto mais dos dois juntos, como se parecem encontrar neste blogue. :)