Os amigos / modas: talvez uma das melhores e mais conhecida seja esta. Se o nosso círculo de amigos usa um iPhone e diz bem do iPhone nós também compramos um iPhone e dizemos bem do iPhone. Assim toda a gente fica a ganhar porque reforçamos mutuamente a nossa ideia de que fizemos uma boa escolha e somos pessoas espetaculares rodeados de pessoas íntimas espetaculares no meio de um mundo mais vasto de freaks feios e anormais. Não interessa nada que o iPhone nem leve um cartão de memória, não permita transferir músicas de forma simples, não dê para ligar a um monitor exterior, nem tenha muitas outras coisas e progrmas e seja caro como tudo. Desde que a gente não saiba de todas essas limitações e que toda a gente à nossa volta nos diga que sim, que aquilo é muita bom. A perspetiva da moda, da fashion, raramente dá mal em termos de satisfação e de prazer. É como pertencer a uma religião. É tão bom saber que vamos ser salvos, sair do ciclo de reencarnações, ou ser ressurretos. Os outros, coitados, até pensam que estão a fazer as coisas bem, pobrezinhos, mas nós vamos ajudá-los. Nós somos bons e vamos ensiná-los. Enfim, novamente, uma boa estratégia para ser feliz!
As características técnicas: Esta é a forma dos nerds como eu. Vai-se ver as características técnicas de tudo e mais alguma coisa, perde-se uma boa dezena de horas a ver cada modelo e a tentar compreender o que é cada coisa (desde o glonass e o A-GPS ao gorilla glass, sensibilidade do wi-fi, os mil e um tipos de CPU e GPU, a memória ram - quantidade e rapidez -, qualidade de imagem, sensibilidade do ecrã, número de dedos reconhecidos, qualidade das câmaras - por pixeis e real -, e mais um sem número de coisas incluindo conectividade, possibilidade de root, bateria, conexões GSM - HSPA+, etc, etc, etc). Finalmente decidimos por um modelo, todas aquelas centenas de horas deram-nos um resultado final. Ele chega e.... não, é horrível. Porquê? Bem, por todas aquelas coisas de que não nos lembrámos... porque o hardware não era fiável e avariou, ou porque o software traz coisas que não queremos e não conseguimos tirar ou não dá para instalar o que queremos, porque é muito pesada, porque a imagem não tem resolução suficiente para os nossos olhos, etc, etc. Esta perspetiva em geral não funciona e razão é simples: o assunto é demasiado complexo, tem demasiadas variáveis. Por mais tempo que dediquemos ao assunto, vai haver sempre aspectos que não conseguimos compreender. É um pouco como o filósofo (não-platónico) / sofista / cientista que tenta compreender o mundo com a mente. Até pode passar centenas de milhar de horas a estudar o assunto, detalhadamente, sistematicamente, mas é daquelas coisas que, a partir de certo ponto: «quanto mais olha menos se vê» porque, precisamente por não conseguirmos abarcar todos os aspectos relevantes, acabamos por dar uma ênfase excessiva àqueles que, por acaso, conseguimos compreender. Era como se, perante um elefante, só conseguíssemos ver mil pixeis tirados ao acaso de uma imagem com mil milhões. Claro que nunca iríamos perceber que era um elefante! Mas, pior do que isso, em vez de manter a dúvida, quanto mais estudássemos aqueles pixeis, mais nos iríamos convencer que sabíamos do que estávamos a falar. Nesse sentido a aproximação científica leva-nos a uma ilusão cada vez maior: cada vez mais estamos convencidos de que sabemos o que se está a passar quando, na realidade, sabemos tanto como os outros e, portanto, menos do que eles.
O aspeto: Esta estratégia normalmente dá mal, apesar de que as pessoas que escolhem pelo aspeto em geral não são muito exigentes e contentam-se com pouco em termos de funcionalidade, mesmo assim costumam escolher coisas tão más "por dentro" apesar de serem bonitinhas à superfície, que normalmente ficam com coisas que ou são praticamente inutilizáveis ou se estragam facilmente. Outro problema é que as pessoas que escolhem pela superfície não sabem realmente como é que funciona isso que compraram. Por isso, mesmo que o objeto seja bom, não o conseguem usar. É daquelas coisas que é giro mostrar aos amigos que se tem e foi "muito caro" e é bom, mas depois fica no móvel sem ser usado dias a fio, porque ninguém lhe sabe mexer. Na vida há algo parecido, as chamadas pessoas "superficiais" (shallow) que só se importam com o que está na aparência. Em geral dão-se mal porque a vida as surpreende constantemente. Estão sempre à espera que aconteça qualquer coisa, que normalmente tem a ver com o que alguém disse ou pensou de alguém. E depois a vida faz qualquer coisa inesperada! Doenças, mortes, despedimentos, aumentos, alguém sai de casa. É tudo muito confuso para essas pessoas. Elas tentam... e, são tão bonitas e têm e fazem coisas tão bonitas... mas... parece que a vida acaba sempre por ser injusta para elas. A beleza não compensa dizem por vezes. Nós diríamos mais: a superficialidade não compensa... É preciso trabalhar um pouco mais para entrar nos detalhes das coisas.
A experiência da comunidade alargada: Aqui já não é tanto o que o nosso círculo de amigos pensa, é mais: vamos a um sítio com recolha de muitas experiências como o
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e vemos as pontuações gerais dos utilizadores, lemos as reviews, vemos os pontos fortes e fracos. Este sistema deu origem à minha primeira boa compra nesta área. Neste caso é um telemóvel que me custou 49 euros e faz tudo o que eu quero. Na realidade ficou de borla porque veio acompanhado de 200 megas / mês gratuítos para toda a vida, e então mudei para um plano sem carregamentos obrigatórios e agora falo pelo skype e outros programas do género, mesmo quando não tenho wifi. Não é propriamente o motorola moto g, mas era o que havia e estou muito contente com ele. Não é fácil explicar porque é que gosto dele, na realidade o único aspeto negativo é que é demasiado lento (só tem meio giga de ram). Mas em tudo o resto é bom, leve, agradável ao tato, etc. Aplicada à vida esta perspetiva não tem bem um nome. Está mais próxima do filósofo-artista que nunca se esquece que nada sabe, mas que mesmo assim continua à procura, em todo o lado, pelas experiências dos outros, das melhores formas de abordar uma certa situação. Note-se que tem de se ir buscar experiências a um conjunto random, alargado de pessoas. Não conta se só ler aquele conjunto de pessoas com quem já sente afinidade (aí voltamos à primeira perspetiva, da moda). Tem a vantagem adicional de, ao saber que nada se sabe, viver a vida como uma aventura e um mistério, ao contrário de todos aqueles empoeirados sábios que, quanto à vida, já "sabem do que se trata" e depois é vê-los com os livros bolorentos, encafuados eternamente nas mesmas salas a ler coisas repetidas... Mas são úteis sem dúvidas para o viajante, como quem vai beber o cheirinho à folha de alface e depois vai buscar um gostinho ao agrião.
O que está mais à mão: essa é a perspetiva mais comum e corresponde àquelas pessoas que, na vida, escolhem o modo de viver presente na sua comunidade. Bem, é fácil de ver o que acontece, é uma questão de sorte. Se nasceres na California numa família rica com casa com vista para o mar é uma coisa. Se nasceres como rapariga naqueles países onde o rapto leva, no melhor dos casos, ao casamento com o raptador / violador, então é a situação já é outra.
O mais caro: Para quem tem dinheiro isto costuma ser um bom método: «dê-me o mais caro que houver». "Bom" no sentido em que se fica com algo com qualidade, não necessariamente algo útil para o sentido da nossa vida. Até nos pode escravizar se tivermos de trabalhar para ter dinheiro (mais uns meses de trabalho forçado para pagar o telemóvel que não me traz a alegria que preciso). Seria interessante aplicar esta analogia ao modo de viver: o que seria escolher o modo de viver "mais caro" em termos espirituais? É verdade que costumamos dizer que tudo tem um preço. Mas, em termos de estilos de vida, o que se "paga" em termos espirituais tanto pode ser um mero gasto como um investimento. Por exemplo, estou a ser médico voluntário em África ou desenvolver um projeto de permacultura, então, para compensar os confortos e outros prazeres e seguranças perdidos, poderei ter avançado / pago com integridade / verticalidade (fazer o que acho que está "certo"). Se tudo correr bem, será um "investimento" nessa integridade: à medida que o projeto cresce, também essa sensação de integridade vai crescendo. Inversamente, para ganhar facilmente prazer - coisas que enchem os sentidos e preenchem as frustrações -, controlo sobre os outros e aquilo a que na sociedade chamamos de "riqueza", posso dedicar-me à fraude ou à manipulação. Neste caso, para ficar mais rico materialmente vou ter de pagar com a minha própria consciência. Mas, neste caso, à maneira do «Retrato de Dorian Gray", o que avanço / pago com integridade / verticalidade, é para perder completamente. Não é um investimento é um gasto puro e simples. Fico sem ele e portanto, se tiver pouco, posso ficar sem nada. Aqui a analogia com o telemóvel é a de saber o que de facto vou fazer com ele. Comprei-o porque me vai ajudar a crescer ou é simplesmente para preencher uma frustração? Não é tanto o que gastei nele que conta, mas mais o que vou construir com ele. Se estiver simplesmente à espera de "encher os meus buracos de contentamento", ou seja, de preencher as minhas frustrações, então espera-me uma vida imensa de enchimento. Porque as nossas frustrações são como poços sem fundo, podemos ir enchendo de coisas que elas querem sempre mais. Se, por outro lado, é um aprofundamento da nossa experiência de ser real, da nossa verticalidade, da nossa consciência, da nossa liberdade, bem, então, talvez, qualquer preço seja barato...
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